terça-feira, 18 de agosto de 2015

Religiões de Matriz Africana no Brasil: É preciso resgatar e nos empoderar do que nos foi roubado.






"Não mexe comigo, que eu não ando só."

Não é raro ouvirmos falar seja na mesa de um bar ou num debate sobre o candomblé, a umbanda, quimbanda, ou  mina. As diversas vertentes das religiões de matrizes africanas que existem no Brasil.

Quando a população negra foi tirada da África e trazida para o Brasil, esse sequestro significou o roubo da nossa terra mãe, da nossa cultura, e de nossa religião. No entanto de resistência é feita a vida do nosso povo, e não foi diferente com nossa  religião. O candomblé por exemplo é uma religião onde se cultua inúmeros Orixás, mas na África cada cidade tinha seu Orixá, e cada cidade cultuava apenas um Orixá. Aqui no Brasil a junção de vários Orixás e entidades no candomblé se dá como forma de resistência, para que a religião não se perdesse e que todos os Orixás e entidades fossem cultuados.

O problema é que a cada dia vemos que as famílias remanescentes de religiões de matrizes africanas tem se findado, ou diminuido. Não é raro ver que as essas familias tem se tornado evangelicas, espiritas, catolicas ou qualquer outra coisa que não tenha ligação com o candomblé ou com a umbanda.

O fato é que nossa religião tem sido extremamente demonizada, e tratada como "coisas do diabo", que te levarão para o inferno. Esta é mais uma tentativa racista de acabar com tudo que lembra ou que significa ser negro. Um tentativa de nos embranquecer cada vez mais, uma tentativa que infelizmente tem dado certo.

Descendo de uma familia que é de terreiro, onde minha biza era mãe de santo, e onde todo mundo ia em festas de terreiro, cultuavam nossos santos, pelo menos até meus seis ou sete anos. De alguns anos pra cá isso se perdeu. E se perdeu de forma criminosa, se perdeu para outras religões, que demonizam o que significou e significa as religiões de matrizes africanas no Brasil. E mais do que isso, o quanto é importante cultuarmos nossos orixás e nossas entidades, para nossa paz espiritual, nossa proteção, mas mais que isso, para que mais essa riqueza que custou sangue, e luta do nosso povo, não se perda. Manter nossos terreiros de pé também é fazer nosso povo resistir!

Não são poucos os casos de terreiros que são fechados, pastores que invadem nossos rituais se dizendo "enviados de Deus para a libertação, represalias em nossos locais de estudo ou trabalho, ou mesmo a ridicularização quem é de santo sofre ser praticante dessas religiões ou carregar uma guia. Há pouco tempo que vimos uma mãe de santo ser morta e uma menina de 12 anos se apedrejada quando saiam do terreiro, ou quando quebraram a imagem de Iemanjá em uma escola.

O preconceito religioso é introjetado em nós desde pequeno, e das formas mais horriveis possiveis.
Por isso, por toda a violencia que nosso povo sofre por manter de pé algo que nos fortalece, que nos une, e que nos faz resistir, é tão importante que nós levemos a frente e com muita garra, sem medo, nossos santos e  nossos terreiros.

Tenho descobrido muita coisa sobre meus santos agora e digo com toda certeza que me sinto mais completa, que sinto mais força pra lutar, porque nossa religião além de linda, só existe porque mães, pais e filhos de santo  fazem luta diária para isso.

Então, toda minha gratidão a minha mãe de Santo, Mãe Fabiana, que tão jovem e em tão pouco tempo já ilumina muitos de seus filhos com sua calma e sabedoria. Ao meu amigo, Diogo Dias, que me levou a aprofundar-me mais sobre sobre esse lado nosso que deve ser cuidado e respeitado.

Agradeço também a Oyá, minha mãe e meu pai Omulu, que andam comigo que tanto me ensinam todos os dias. E meus Exus, estão sempre por perto e sinto vocês.

É importante resgatar a história do nosso povo. É importante valorizar a luta que eles fizeram para manter de pé o minimo, o som dos atabaques e as saias brancas a rodar, a música cantada e a entidade a falar!


quinta-feira, 25 de junho de 2015

Porque a USP tem medo das cotas raciais?

E rancorosos, maldosos muitos são,
Quando falamos numa miníma reparação:
- Ações afirmativas, inclusão, cotas?!
- O opressor ameaça recalçar as botas..
Nos mergulharam numa grande confusão
Racismo não existe e sim uma social exclusão
Mas sei fazer bem a diferenciação
Sofro pela cor, o patrão e o padrão
-Carta a Mãe Áfria (GOG)

Talvez seja a primeira vez que você esteja lendo um texto sobre cotas raciais. Talvez seja a centésima vez que você está lendo um texto sobre cotas raciais e por acaso saiba que quando exigimos as cotas raciais, estamos exigindo reparação histórica a um povo que foi retirado de sua terra mãe e trazido a força para uma terra estranha, sofrendo os piores e mais bárbaros tipos de violência. 

Não bastasse os séculos de escravidão sofridos pela população negra, após a escravidão nos lançaram nos mesmos postos de trabalho, só que agora, com um fator interessante, estavamos livres! A Lei Áurea havia sido assinada. 

São menos de cento e cinquenta anos sem escravidão no Brasil, e as marcas de quase quatro séculos de exploração da população negra ainda seguem fortes e presentes. 

No Brasil, um jovem negro tem 160% de chances de ser assassinado a mais que um jovem branco, as mulheres negras tem 53% de chances de sofrerem violencia sexual, ocupamos 60% dos postos mais precários de trabalho (limpeza, cozinha, telemarketing, trabalhos domesticos), recebemos os mais baixos salários. 

A Universidade de São Paulo, é a principal universidade do país e nega-se a discutir o problema do racismo. Nega-se a discutir o número infimo de 7% de negros ocupando as cadeiras das salas de aula, enquanto a população brasileira é de maioria negra. 

Desde o inicio do ano a ofensiva do movimento negro tem sido grande para que a USP passe a aderir ao sistema de cotas raciais e sociais, como uma real medida de democratização do acesso ao ensino superior. 
Desde iniciativa criada por alunos negros como as Ocupações Pretas em salas de aula e Conselhos Universitários, até o ato do 13 de maio, quando o movimento negro entrou na universidade exigindo o fim do racismo e cotas raciais, até o mais recente acontecimento, o I Seminário de Negros e Negras da USP, que serviu como um fórum que contou com centenas de estudantes da USP, dos mais diversos cursos e campus da universidade. 

Mas afinal, porque a USP tem medo das cotas? 

A USP foi criada para formação de quadros brancos e da burguesia, como já cansamos de ouvir por aí "da usp sai a elite brasileira", e essa elite tem raça e classe. 
Desta universidade saem nomes como Fernando Haddad e Fernando Henrique Cardoso. 

O pretinhos podem querer com a USP?

Não atoa, os apenas 7% de alunos negros que existem dentro da USP, sempre questionaram a forma como o acesso a essa universidade é feito. A FUVEST é o vestibular mais disputado do país, e também o mais difícil. 
Os jovens negros de escola pública não tem condições objetivas de realizarem uma boa prova, e isso acontece por um motivo simples, o ensino básico da população negra é público e por isso precário; as salas de aula são super lotadas e além de estudarmos precisamos trabalhar, não temos condições de fazer um cursinho e na maioria das vezes precisamos optar por trabalhar ou entrar na universidade. 

Todos estes fatores nos impedem de entrar em uma universidade como a USP. 

Quando ocupamos as salas de aula desta universidade, estamos querendo dizer que estamos cansados de rostos brancos nos ensinando, cansados de ver apenas rostos brancos pelos corredores, banheiros, bandejões e lanchonetes. Estamos cansados de entrar no circular e ver apenas rostos brancos, exceto o do cobrador e motorista. 
Quando ocupamos as salas de aula desta universidade, estamos querendo dizer que já passou da hora de os corredores e salas de aula estarem mais negros e corresponderem ao fato de que a maioria da população é negra, nada mais justo do que ocuparmos formalmente estes lugares. 

No ultimo conselho universitário a USP aprovou o ENEM, enquanto a luta do movimento negro e movimento estudantil segue sendo por cotas raciais. 
Aprovaram o ENEM, deslegitimando assim toda a luta travada por todo o movimento negro. 

A pergunta que fica é, porque não cotas raciais? Porque é tão dificil a USP e o estado de São Paulo admitirem que são racistas e elitistas e por isso não querem nos dar algo que nos é de direito? 
Qual justificativa para isso? 
Enquanto a população negra sofre por todos os lados com centenas de ataques, como a redução da maioridade penal, aumento do tempo de prisão para menores infratores, é necessário estamos ainda mais firmes na luta por reparação histórica e imediata do povo preto!

É necessário OCUPAR, ENEGRECER E FAZER DA USP UM QUILOMBO! 
Contra o racismo! 
Contra a precarização do ensino!
Por cotas raciais já!